Brasareiros

01 fev

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— Aprendemos a respeitar o fogo e amá-lo, ao mesmo tempo. Aprendemos a viver onde nosso mapa aponta. Arre! Somos desse mundaréu e o fogo é a nossa língua, nossa pátria. Seu moço, somos nada não!

— Mas os homi cegos que vêm aqui de vez em quando falar que nóis emprega crianças onde num deve, nem enxerga nóis direito. Eles têm medo di nóis. Mas eu te pergunto: medo de quê? Por quê? Pra quê? A gente é nada não, fulige sem nome cheirando a carne queimada.

— Olha pra nossas caras… Somos todos pretos. Fulige iguala nóis com a noite. Somos todos daqui, do fogaréu. Nascemos e morremos como um sopro de Deus. E só deixamos cinza para encontrar a terra. Mundaréu cheio das porteiras. Vai ver era para ser assim mesmo, né não?

— Somos todos brasareiros, brasileiros de brasa. Carvão. Ou melhor, cinzas. Somos apenas cinzas do que já fomos, do que podíamos ser. Tudo em nóis queima, foi queimado e não existe mais. Nem sinal de fumaça.

— E vosmecê pode estar perguntando: mais quem são essas vozes que falam? São as vozes do fogo, das labaredas! Fogo de quem não existe mais. As vozes dos ausentes. Dos incinerados. As vozes que engolem fogo.

— Com o fogo se queima e é queimado. E não existe mais nada depois das cinzas. Todos esses meninos que vocês vêem aí correndo entre fornos são restos de sonhos, são zumbizinhos carbonizados. São gente não, são carvão e restos de brasa. Brasareiros.

— Enquanto isso, na China o sol é coberto por uma imensa nuvem de fumaça.

 

(Autor: Wagner Merije)

 

 

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